O SOCIALISMO MORREU.


Lembro-me que há cerca de 25 anos Soares disse que meteu o socialismo na gaveta.
E lembrei-me disto ao pensar que Sócrates devia dizer, no próximo congresso do PS, que o socialismo morreu.
Se o socialismo de tipo soviético, marxista e leninista foi enterrado com a queda do muro de Berlim, acho que chegou a hora de dizer que o socialismo democrático também morreu.
Já desde o fim do séc. XIX princípios do séc XX houve um grande cisma entre os marxistas. A revolução soviética que quis criar o Homem novo transformou-se numa sociedade onde a liberdade foi suprimida, a economia estatizada, sem lugar à propriedade privada onde os direitos de cidadania desapareceram, o poder político se confundiu com o Estado transformando-se num governo oligárquico, onde a classe dominante detinha todos os privilégios, surgindo um movimento que se desviou desta linha, a social democracia, que mantendo a utopia de uma sociedade sem classes e igualitária mas acreditando que essa sociedade seria alcançada sem revolução mas por meio de uma evolução democrática.
A Internacional Socialista definiu a social democracia como a forma ideal de democracia representativa que poderá construir uma sociedade de bem estar. E define como princípios a liberdade, não só como a liberdade do individuo, mas inclui na noção de liberdade o direito de não ser discriminado, o direito das minorias, a igualdade e a justiça social não apenas perante a lei mas também em termos económicos e sócio-culturais o que permite a igualdade de oportunidades e finalmente, um terceiro principio, o da solidariedade com as vitimas de injustiça e da desigualdade.
Julgo que toda esta ideologia continua actual, embora discorde que o fim dela seja a sociedade socialista, vista esta como uma sociedade sem classes, igualitária e universalista.
O mundo mudou, hoje a economia de mercado é única resposta para a criação de riqueza, as alterações do poder entre classes, com o proletariado a ser cada vez menos importante, o individualismo versus o colectivismo, onde o individualismo é cada vez mais um valor humanista, por oposição ao socialismo, são tudo noções e conceitos que se alteraram.
Assim como o mundo mudou, as ideias politícas também se alteraram.
A Desigualdade, entendida como uma livre escolha de cada cidadão, com oportunidades iguais é, na minha opinião, a nova utopia.
Assim julgo que os partidos “socialistas” deviam assumir a evolução histórica deixando cair a sociedade socialista. E sejamos claros, já nenhum partido destes defende essa sociedade.
Toda a política destes partidos não é no sentido socializante, mas de alteração do Estado Providência. E em que sentido? Na minha opinião o Estado não pode garantir a a mesma coisa a todos. Apenas deve garantir, e de forma desigual, aqueles que realmente necessitam.
Assim, eu proclamo (passe a imodéstia): o Socialismo morreu.
Mas continuo a pensar que ainda se pode falar em esquerda e direita. A esquerda não socialista “definirei” como a ideia de que o bem colectivo se deve sobrepor aos interesses particulares. Onde a solidariedade seja pedida a todos consoante as suas possibilidades, apesar de a sua distribuição não ser universal. E também a ideia que o mercado e a livre concorrência são um bem em si mesmo, mas não resolvem tudo.
Que dizem?
Saúdinha

14 comentários:

Rantas disse...

Concordo - nessa perspectiva, o socialismo morreu. Mas já foi há uns anos...

E qual é a definição de direita?

Anónimo disse...

Que dizer?

Não percebo como é que a tua nova esquerda vai conciliar a “utopia da Desigualdade” com o “sobrepor do bem colectivo sobre os interesses particulares” …

Ou fui eu que não percebi muito bem?

Alex disse...

Caro Harpic, acho que deves dizer o que te aprouver.
Não acho que exista contradição no que disse. A "utopia" da desigualdade, entendida esta como a liberdade individual de cada cidadão, pressupõe que cada um tem condições de escolha. E o exercício do poder é a criação de leis para o bem comum. O bem comum é que é uma dificil definição. E é subjectiva. Mas eu espero que os governos governem para todos, criando condições para cada um poder escolher como quer viver a sua vida. É a velha máxima de que a liberdade de cada um termina quando interfere com a liberdade dos outros. A questão da esquerda e direita é cada vez mais dificil de distinguir. Hoje os valores de esquerda e de direita são em grande parte comuns. Estou a falar dentro de balizas da democracia ocidental, é óbvio que ainda há muita gente a defender a sociedade socialista, a propriedade colectivista, o controle da oferta e procura, com preços distorcidos, onde o Estado garante tudo a todos. E por outro lado também há gente muito nacionalista, xenófoba, autoritária. Não estou a falar destes conceitos de esquerda e direita que, infelizmente ainda existem mas que estou contra.
Nas democracias ocidentais, pluralistas, de economia de mercado, de concorrência, de direitos dos cidadãos, da soberania do povo, as diferenças entre esquerda e direita são ínfimas. Quem pode dizer que Sócrates, ou Blair fazem politicas de esquerda? Ou Chirac ou Merkel fazem politicas de direita? Hoje já quase não se distinguem. Assim, a melhor ideia que consegui é uma questão de atitude. A atitude da esquerda é defender o interesse colectivo perante o interesse particular e a atitude de direita seria defender o interesse particular perante o interesse colectivo (respondi-te Rantas?). Mas gostaria que dessem a vossa opinião, se ainda há diferenças e se sim, qual seria a melhor maneira de as distinguir. Na prática defender o interesse colectivo é, por exemplo achar que o mercado não é resposta para a Educação, Saúde, Seg. Social, Apoio à injustiça, Cultura, Ambiente, Ordenamento do Território.
É por exemplo, as contribuições serem conforme os rendimentos e as prestações sociais serem conforme as necessidades.
Neste post, quero dizer que, hoje, os partidos socialistas não defendem a igualdade. Hoje o mercado e a concorrência é a resposta para a economia, hoje os trabalhadores tem mais defesas que os empresários, hoje o individualismo, as associações de cidadãos, as questões locais tem uma importância que não tinham antes, devido à revolução da informação. E isso faz com que não faça sentido falar-se em sociedade socialista. O que, para mim, faz sentido é defender isto tudo, e tendo no Estado um agregador de vontades em defesa, não de interesses particulares, mas do "bem comum".
Como sabem não sou nenhum teórico de ciência política, mas gosto de discutir estas coisas. Para mim há esquerda para lá do socialismo. Poderá ser uma esquerda liberal?
Vou fazer mais posts na sequência do Desigualdade.
Saúdinha

manolo disse...

A pressão de ter de crescer (aumentar o PIB) é que não é bem compreendido pelos "leais" socialistas. Dizia-me um "os cubanos, coitados, são tão pobrezinhos...", mas logo corrige, "mas são felizes, os bens materiais não trazem felicidade". Ora se não crescermos (relativamente aos nossos vizinhos) a diferença do bem estar é como um abismo. Optando o país por crescer, isso implica, iniciativa privada, concorrência dura, exigência, responsabilidade, disciplina, etc. Mas simultaneamente é necessário segurança, apoio na doença e desemprego, e solidariedade com os que nada têm. Todos estes valores são de direita e esquerda. Hoje a diferença não está aí mas sim, como sempre nos que se opõem à mudança e os que se adaptam a ela.

Anónimo disse...

O exercício do poder é a criação de leis para o bem comum na tua opinião; já na minha o exercício do poder deve ser a criação de leis para garantir a minha liberdade (e a tua também, claro!)

Eu não ando à procura de contradições no que dizes; continuo é sem perceber como é que eu tenho liberdade de escolha em matérias relacionadas com a Educação, a Saúde, a Segurança Social, a Cultura,…. se as opções que eu tenho são todas orientadas para garantir o bem comum (que não é necessariamente o meu). Isto é um bocado como o meu pai dizia: “Aqui em casa todos tem o direito de fazer como eu quero!”…. ele também estava a defender o bem comum!

Vais-me desculpar mas eu acho que tu estás a misturar as coisas: não se pode ao mesmo tempo estar a defender o bem comum e a deixar a cada um a liberdade de escolha. Se disseres que hoje os governos ditos de Esquerda reduziram muito o seu nível de intervenção em algumas áreas, deixando maior margem para que cada individuo faca as suas próprias escolhas, enquanto noutras continua a intervir e a condicionar as escolhas de cada um por forma a garantir que os benefícios são equitativamente distribuídos, aqui já concordo. Agora os dois ao mesmo tempo e que não.

O Manolo fala mais na distinção entre Conservadores e Progressistas. Julgo que é uma distinção independente da que fala o Alex; há conservadores e progressistas tanto à esquerda como à Direita. E concordo que esta dicotomia é hoje mais interessante de discutir do que a primeira. Ela leva-nos mais no sentido de reflectirmos qual o Mundo que queremos para os nossos filhos.

Alex disse...

Eu posso concordar que as leis devem garantir a minha liberdade de escolha. Deve haver é condições para todos terem essa opção. O bem comum é o objectivo das politicas dos governos. É evidente que o que alguém considera ser o bem comum, não o será para outros. Por isso existem os vários partidos, várias ideologias que consideram o bem comum diferentemente. Mas qualquer governo faz politicas convencido de que está a melhorar o bem estar dos cidadãos.
Isto não colide com a liberdade individual, o Estado apenas intervêm para garantir que os cidadãos possam ter essa opção de escolher, limitando-a à liberdade do outro ou dos outros.
A mim parece-me que todos os governos de esquerda reduziram a sua intervenção. É a evolução das ideias politicas. E a história não volta atrás. Por isso digo que o Socialismo morreu. E também digo que os beneficios não devem ser distribuidos equitativamente. É a mudança que a Europa tem que fazer. O Estado garante menos, apenas aos que necessitam, e os cidadãos têm mais espaço para as suas decisões.
Eu também acho que a Esquerda e a Direita não é a discussão actual.
É de facto entre aqueles que percebem a necessidade de mudança e aqueles que querem manter o estado actual.
Qual o sentido da mudança, essa é a discussão que tentamos fazer.
Saúdinha

El Ranys disse...

O que é o "bem comum"?
És tu próprio que escreves, Alex, o seguinte:
"O bem comum é que é uma dificil definição. E é subjectiva. Mas eu espero que os governos governem para todos, criando condições para cada um poder escolher como quer viver a sua vida."

Eis, aqui, a grande questão. Como raramente partilhamos a visão de outro sobre o que é o "bem comum", ele é, por natureza, indefinível. E, assim, remetemo-nos à nossa própria concepção do conceito. Procuramos, pois (devemos procurar) o nosso "bem individual". Se formos pessoas com ética e valores, procuramos fazê-lo sem atropelar o "bem individual" de outros e defendemos a nossa própria esfera de interesses de ataques externos. É neste conflito que o Estado deve surgir como "entidade reguladora". Mas a mola da vida em sociedade não pode deixar de ser esta procura individual do "bem", seja ele qual fôr. Remeter essa procura e os seus objectivos para o Estado, como grande "farol" do "bem", é de esquerda. Devolver aos cidadãos a decisão é de direita. Isto se ainda existem esquerda e direita. O que não existe, seguramente, é esse tal "bem comum". Estás quase lá, Alex, mas ainda tens de te livrar de alguma "sucata ideológica" ;-)

manolo disse...

Vejo, el ranys, que és uma espécie de farol, pronto para ajudar a libertarmos a "sucata ideológica"...
O papel do Estado Democrático é o de conciliar a liberdade individual, a ambição individual do bem-estar com uma solidariedade aceite e consentida, (que pode ser entendido como "bem comum"). O problema é muitas vezes, o Estado exceder a sua intervenção, tornando-se demasiado centralizado e não dar oportunidade aos individuos o resolver melhor os seus problemas.
O post do Alex, falava já do papel do Estado:
http://merdex.blogspot.com/2006/07/desigualdade.html

Alex disse...

El Ranys é verdade que o bem comum é subjectivo, como disse. Mas é uma ideia já muito antiga. Todos os partidos pretendem ter a sua ideia de bem comum. Mas a verdade é que um governo, governa em nome desse bem comum. Se não é uma tirania ou uma oligarquia. A ideia de bem comum já vem de Aristóteles :
"Na filosofia aristotélica a política é o desdobramento natural da ética. Ambas, na verdade, compõem a unidade do que Aristóteles chamava de filosofia prática.
Se a ética está preocupada com a felicidade individual do homem, a política preocupa-se com a felicidade coletiva da pólis. Desse modo, é tarefa da política investigar e descobrir quais são as formas de governo e as instituições capazes de assegurar a felicidade colectiva. Trata-se, portanto, de investigar a constituição do Estado."
Mas a liberdade individual não é antagónica do bem comum.
Quando dizes que "É neste conflito que o Estado deve surgir como "entidade reguladora" estás a dizer o que eu disse.
Mas havemos de continuar esta discussão noutro post.
Saúdinha

El Ranys disse...

Com essa do Arostóteles é que me lixaste. Já pareces o Pacheco Pereira e alguns dos blasfemos mais os seus gurus. Detesto citações, sobretudo quando utilizadas como argumento de autoridade. A democracia grega, como bem deves saber, não era exactamente uma democracia. O mundo não era global, vivia-se na e para a pólis.
Citar Aristóteles é giro, fica bem, mas não adianta um corno à discussão.
O que eu disse é que NÃO HÁ "bem comum". Tu vens-me dizer que Aristóteles disse que havia. Sabes tu o que, segundo consta, disse Herodes?

Anónimo disse...

Quando isto for posto em livro até já temos titulo: “O Faroleiro e o Sucateiro”.

Manolo e Alex, simpáticos amigos esquerdistas,

O “comum” não tem identidade própria; só existe na medida em que é participado por indivíduos com identidade própria. Os interesses desta unidade supra-individuo vão necessariamente chocar com os interesses particulares dos indivíduos que a compõem. Se o Estado quer garantir os interesses do grupo (“comum”) vai mais tarde ou mais cedo ter de contrariar os interesses individuais portanto não lhes pode dar liberdade de escolha.

A “utopia da desigualdade” do Alex (oh Alex estás a fazer Escola!) pressupõe necessariamente o abandono desta noção do “comum”; ao indivíduo passa a ser dada a liberdade de escolha para garantir o seu próprio bem; enquanto que ao Estado é dado o papel de garantir as liberdades positivas de cada individuo na exacta medida das suas necessidades, e não numa medida standard pré-estabelcida a que todos os indivíduos que compõe o tal grupo (“comum”) teriam direito.

Quanto ao Aristóteles, amigo Alex, se tu achas que o Estado deve deitar mão a uma forca de trabalho escrava para garantir o bem-estar da Pólis; então tá bem! então eu também sou pelo bem comum!

Oh Ranys, o Herodes era liberal?

Alex disse...

Caríssimos Ranys e Harpic já entendi que vocês não gostam da ideia de bem comum! Eu concordo que não há uma ideia de bem comum. Cada um tem a sua. O que digo é que o governo só intervém na medida em que entende ser o bem comum. Um governo pode entender que não deve legislar nada porque esse facto é o que melhor defende o bem comum. Nós podemos ter um governo que quer incentivar a familia, e, pela via fiscal, promove o nascimento bebés. Entende que está a melhorar a sociedade, a promover o bem comum. Por outro lado a China proibiu mais que um filho aos casais chineses. Entendeu que era o bem comum para o seu país. Eu não defendo a intervenção do Estado, pelo bem comum! A discussão não deve ser se há ou não bem comum, porque cada um tem a sua ideia. O que quero discutir é como, em que medida, e em que sectores um Estado deve intervir para melhorar a sociedade (o bem comum).
Quanto ao Aristóteles... Foi um grande pensador, e não vejo o que a escravatura tem a ver com isso.
O Faroleiro e o Sucateiro????
Saúdinha

Anónimo disse...

"Eu não defendo a intervenção do Estado, pelo bem comum!"

"O que quero discutir é como, em que medida, e em que sectores um Estado deve intervir para melhorar a sociedade (o bem comum)."

Mau, entao?

Pronto estou a reinar e acho que esta questao aqui ja se tornou um bocado retorica. Concordo que é mais interessante discutir os sectores em que o Estado deve intervir. Vamos abrir novo post sobre esta tematica.

So para terminar (e esclarecer a minha afirmaçao):o Aristoteles foi de factor um grande pensqdor. Mas defendia que os povos "barbaros" deviam ser escravizados e servir para garantir o " bem comum" da sua polis.

O Faroleiro e o Sucateiro pareceu-me um titulo engraçado depois do Ranys dizer que tu tinhas sucata ideologica e o Manolo chamar o Ranys de Farol... uma graçolas facil!

Alex disse...

De facto quando li o comentário, ao ver esta frase percebi que não estava entendível. Quis dizer que eu posso defender uma politica de não intervenção do Estado, porque isso é o melhor para o bem comum.
Saúdinha